Aos 73 anos, o investidor americano Sam Zell, maior especialista
mundial em comprar e vender imóveis,
passa mais de 200 dias por ano longe de seu escritório em Chicago. Ele recebeu
EXAME na suíte de um hotel paulistano na manhã de uma terça-feira, apenas 1
hora depois de ter chegado dos Estados Unidos e a poucos dias de embarcar de
novo.
Recentemente,
esteve em países que passam longe do radar de alguns dos principais
investidores do mundo, como Líbia e Mongólia. Para Zell, essa curiosidade é
essencial na hora de farejar boas oportunidades e, principalmente, para nadar
contra a corrente. Ele é especialista em comprar empresas desprezadas pela
concorrência e em pular fora na hora certa.
Em
2007, às vésperas da crise americana, fechou o maior negócio da história do mercado imobiliário ao vender a empresa de imóveis
comerciais Equity Office Properties por 39 bilhões de dólares. Foi assim também
em seu maior investimento no Brasil, a construtora Gafisa — de onde saiu em
2012, meses antes de a empresa despencar na bolsa.
Agora
sua maior aposta é a empresa de armazenagem Guarde Aqui, que atua num mercado
ainda pouco relevante no país. Enquanto os grandes fundos olham o Brasil com
desconfiança, ele diz que essa é a hora certa de novos investimentos por aqui.
EXAME
- Dois anos atrás, o senhor disse a EXAME que o Brasil viveria anos difíceis
pela frente. E agora?
Sam
Zell - O
Brasil de fato está passando por um período difícil. Mas eu acredito que as
forças do país vão, afinal, prevalecer. O presidente Lula foi bem-sucedido
porque combinou ações sociais com prudência econômica. A administração atual
esqueceu a prudência. Isso fica claro com as políticas de nacionalização, como
no setor de petróleo.
Em
vez de usar tecnologias conhecidas em todo o mundo, o país preferiu construir
as próprias. Isso é imprudente de qualquer perspectiva. Com a escolha do novo
ministro da Fazenda, há chance de uma volta à racionalidade.
EXAME
- Então o senhor está otimista com os próximos anos do Brasil?
Sam
Zell - Sim. Vocês têm escala. São 200 milhões de pessoas. Isso cria
oportunidades. Esta é uma sociedade muito “aspiracional”. Nossa motivação
original para investir aqui era a crença de que o movimento das classes mais
baixas para a classe média e para a classe alta seria muito positivo para o
Brasil.
Claro
que está muito mais difícil agora do que há cinco anos. Por outro lado, há
cinco anos todos os meus concorrentes estavam aqui. Hoje, até onde eu sei, sou
o único. Em nossa história, há uma correlação direta entre sucesso e grau de
competição. Com competição intensa, é muito difícil fazer bons negócios.
EXAME
- A pergunta que todo mundo faz por aqui: o preço dos imóveis cairá?
Sam
Zell - Se tivesse de apostar, apostaria contra a queda de preços. No
lado residencial pode ter havido um excesso de oferta em algumas regiões. Mas
não houve excesso de oferta em escritórios, no varejo, em galpões.
É
diferente do que aconteceu nos Estados Unidos, onde tudo parou. Os bancos
pararam. No Brasil, os bancos estão bem. E não acho que vocês tenham os
instrumentos financeiros tóxicos que contribuíram para os problemas nos Estados
Unidos.
EXAME
- O senhor é conhecido por grandes investimentos. Mas hoje, no Brasil, tem
investimentos pequenos na construtora paranaense Thá e na empresa de estocagem
Guarde Aqui. Planeja grandes tacadas?
Sam
Zell - Estamos prontos para fazer grandes ou pequenos investimentos de
acordo com o tamanho das oportunidades. Não nos preocupamos com o tamanho do
investimento, mas com o potencial de crescimento e com a possibilidade de fazer
a diferença em determinado mercado.
A
Guarde Aqui atende a classe média ascendente. Ela quer acumular coisas. E os
apartamentos estão cada vez menores. Aqui já somos líderes de mercado, mas
temos enormes oportunidades para crescer. Não vejo limites. No Grupo Thá, somos
muito mais dependentes da saúde do mercado residencial.
EXAME
- O Brasil ficou para trás na comparação com seus vizinhos?
Sam
Zell - A Colômbia e o Peru são as estrelas do continente agora. Quando
viemos ao Brasil pela primeira vez, jamais teríamos investido na Colômbia.
Agora temos grandes investimentos por lá. Se tivesse de escolher um país
favorito no mundo, atualmente, seria a Colômbia. O Peru está no nosso radar.
Provavelmente,
o elefante na sala é a Argentina, que está uma bagunça total. Eles terão uma
oportunidade com uma mudança de governo no ano que vem. A Argentina tem uma
longa história de irresponsabilidade fiscal, que torna investir por lá muito
desafiador.
EXAME
- O senhor se preocupa com o ambiente político da região?
Sam
Zell - Claro. Olhe para o real, que foi de 1,75 para 2,60. É uma
desvalorização muito grande. E obviamente vai trazer dificuldades para o país,
vai criar inflação. Decisões políticas impactam diretamente nossos investimentos.
EXAME
- Política é o fator mais importante na hora de o senhor decidir investir ou
não em determinados mercados?
Sam
Zell - Começa com a política. Depois vem a economia. Mas, se a política
não for razoável, a economia não importa. Aprendemos isso em países como a
Venezuela. Outra questão importante é a demografia. No Japão e na maior parte
da Europa, há menos pessoas em dezembro do que havia em janeiro.
Como
um investidor, o que faço é tentar determinar onde a demanda está e ver como eu
conseguirei suprir essa demanda. Se a população estiver encolhendo, a demanda
também estará. Então, eu prefiro investir no Brasil ou na Índia, onde a
população e a demanda vão crescer.
EXAME
- Como o senhor estuda seus mercados potenciais?
Sam
Zell - Eu leio o tempo todo. E também viajo muito. Há algum tempo,
comecei a ler sobre a Mongólia. Li que a Gucci estava abrindo uma loja em Ulan
Bator, capital do país. Achei aquilo maluco. Peguei um avião e fui até lá. Não
havia nada lá para eu fazer, mas é tudo parte do processo de aprendizagem.
Você
não pode ser um empreendedor de sucesso se não é um observador atento. Isso é
fundamental para ver as coisas com simplicidade. Hoje, imóveis representam
cerca de 30% de meus investimentos. Os outros 70% estão distribuídos em
diversas áreas.
Mas
isso não traz complexidade. Não investimos em alta tecnologia, por exemplo,
porque não conhecemos. Mas investimos muito em áreas como energia e logística,
em que podemos fazer diferença.
EXAME
- Como diferenciar uma boa oportunidade de um negócio com risco excessivo?
Sam
Zell - Minha análise começa não com quanto posso ganhar, mas com quanto
posso perder no negócio. Dedico 80% da minha atenção a isso. Nos anos 90, por
exemplo, fechei uma enorme compra na Califórnia. Nossa análise apontou que, se
tudo desse errado, perderíamos 50 milhões de dólares. E de fato passamos por
incêndios, terremotos e essas coisas que acontecem por lá. Perdemos justamente
50 milhões. Para mim, é um caso de sucesso.
Fonte: Revista Exame
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